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Não faltam médicos em Portugal. Só estão mal aproveitados

01 jul, 2014 • Sandra Afonso

Há 101 perguntas incómodas sobre Portugal que encontram resposta no livro “O Economista Insurgente”.

Pode a economia responder ao que os políticos não nos dizem, sem previsões, cálculos complexos ou palavras difíceis? Dois economistas e um gestor dizem que sim, num livro onde perguntas que andam de boca em boca encontram resposta, a partir de estatísticas e parâmetros económicos.

"O Economista Insurgente” quer traduzir a economia que há na vida que nos rodeia. Segundo Miguel Moniz, um dos autores, usam perguntas que nos estão próximas, “por que é que os portugueses chegam atrasados a todo o lado, ou por que é que se queixam dos políticos mas depois votam sempre nos mesmos partidos”. As respostas são “muitas vezes mais simples de dar se for usado um enquadramento de análise com recurso a ferramentas económicas, como incentivos sobre oferta e procura, concorrência”.

A saúde tem direito a um capítulo. Desde a aversão dos médicos aos genéricos até à falta de enfermeiros, passando pela ausência de desemprego entre a classe médica até à pergunta clássica: por que faltam médicos no país?

As listas de espera, as notícias sobre médicos de família e outras especialidades e os sucessivos protestos contra encerramentos de unidades de saúde apontam para a insuficiência de recursos humanos, mas, segundo Miguel Moniz, “as estatísticas dizem o contrário": "na verdade, nós temos uma média de médicos até bastante superior à da OCDE e da União Europeia. Há algumas dúvidas se isto inclui muitos dos que já estão reformados, mas mesmo que compensemos esse factor a quantidade de médicos que temos deveria ser suficiente para não termos faltas”. Entre as explicações possíveis, Miguel Moniz destaca o facto de muitos médicos estarem a compensar a falta de enfermeiros e/ou exercerem funções administrativas.

Por que é que tanto protestam os professores?
Também debaixo dos holofotes estão os professores. Desde o início dos anos 90, Portugal já teve 11 ministros da Educação, destes, apenas dois estiveram em funções mais de dois anos.

Por que é que tanto protestam os professores? É o resultado de um sistema de ensino que “durante muitos anos funcionou para agradar aos professores e não para agradar aos alunos e aos pais. Hoje temos um sistema que tem em média quase o dobro dos professores necessários, tendo em conta as médias europeias, há um sistema que não é justo para quem está em início de carreira e para o país, porque sai caríssimo”, argumenta Miguel Moniz.

Das escolas generalizamos ao país, por que é que nada funciona bem? Por que é que os transportes públicos estão sempre em greve, os combustíveis são caros e nem a liberalização desceu os preços? Por que é que o salário mínimo é pequeno e os bancos têm lucros que muitos dizem ser obscenos? Por que é que Portugal está "falido"? Miguel Moniz lembra as promessas feitas pelos políticos, que “custaram mais do que o dinheiro que a economia conseguiu gerar através dos impostos, como auto-estradas”.

Restou-nos pedir ajuda aos credores internacionais, que logo apontaram o dedo à nossa falta de competitividade. Os alemães ficaram com a ideia que somos preguiçosos. Miguel Moniz explica que a produtividade dos trabalhadores portugueses é inferior, mesmo que trabalhem mais horas, mas isso explica-se pelas circunstâncias da economia, entre elas a falta de capital.

O gestor deixa um exemplo: “um condutor de um autocarro, por mais horas que trabalhe, não vai conseguir viajar tanto como um piloto de um avião, porque vai conseguir fazer mais quilómetros no mesmo espaço de tempo”.