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Governo ainda não lançou investigação sete meses após colapso do Citius

29 abr, 2015 • Liliana Monteiro, Inês Rocha, Joana Bourgard, Conceição Sampaio (RR) e Mariana Oliveira (Público)

Em entrevista ao programa "Terça à Noite", da Renascença e jornal “Público”, a presidente do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça afirma que ainda não se conhece a origem do problema que afectou o Citius. Albertina Pedroso faz também contas aos gastos da justiça com o arrendamento de 325 edifícios.

Governo ainda não lançou investigação sete meses após colapso do Citius
Em entrevista ao programa "Terça à Noite", da Renascença e jornal “Público”, a presidente do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ) afirma que, nesta altura, ainda não se sabe qual a origem do problema no Citius. Albertina Pedroso não afasta a hipótese de criação de um novo sistema e faz contas aos gastos da justiça com o arrendamento de 325 edifícios. Os encargos mensais rondam dos três milhões de euros. O Campus da Justiça custa um milhão e vai aumentar.

A presidente do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ), Albertina Pedroso, revela que, sete meses depois do colapso do Citius, o sistema informático da justiça, o Governo ainda não avançou com uma auditoria para perceber o que aconteceu no arranque do novo mapa judiciário.

Em entrevista ao programa “Terça à Noite”, da Renascença, e ao "Público", Albertina Pedroso afirma que, nesta altura, ainda não se sabe qual a origem do problema. Quanto à prestação do sistema, a presidente do IGFEJ garante que tudo regressou à normalidade e que os atrasos começam a ser recuperados. Há alguns problemas pontuais, mas não há processos perdidos, indica Albertina Pedroso, não afastando a hipótese de criação de um novo sistema, ainda que a aposta, para já, passe por melhorar o actual.   

Nesta entrevista Renascença/Público, Albertina Pedroso faz o ponto de situação das rendas da justiça. A tutela mantém encargos mensais de três milhões de euros, com o arrendamento de 325 edifícios. O Campus da Justiça, em Lisboa, é dos espaços mais caros. A negociação que foi feita para reduzir a renda termina em Abril. A partir de Maio, em vez de 1,038 milhões de euros, o Governo passa a pagar 1,150 milhões.

Nesta altura, como está o Citius e, afinal, o que aconteceu realmente em Setembro?
A aplicação informática que suporta a actividade dos tribunais está estabilizada, quer ao nível das secretarias, quer dos magistrados e da aplicação dos mandatários. Foram recuperadas as funcionalidades que existiam antes de Setembro de 2014. Não fazem sentido algumas críticas recentes de advogados que dizem que ainda estão a ser chamados para comprovar requerimentos que já tinham sido entregues, de alguns documentos que se tentam pontualmente localizar e não se encontram, de um ou outro processos esporádico que se tenta aceder na base de dados e não se encontra. Nada desapareceu no sistema. Isso é uma garantia. O que acontece é que ele pode ainda estar na antiga estrutura. E quando as pessoas procuram na nova estrutura e na nova o documento pode não lhes surgir.

Qual foi o atraso que este problema terá causado?
Não tenho forma de fazer essa estimativa. É evidente que este constrangimento durante 44 dias tem impacto no funcionamento dos tribunais. O quanto depende dos tribunais e da capacidade instalada. É muito diversa de comarcas para comarca. Em muitas já estará quase absorvido esta paragem, noutras as dificuldades ainda subsistem. Tudo depende do número de funcionários que têm afectos a determinadas jurisdições.

O que falhou realmente no Citius?
Não estamos a trabalhar na identificação do problema. O secretário de Estado fez uma proposta para se avaliar tecnicamente e auditar aquilo que se passou. Essa tarefa foi solicitada pelo secretário de Estado à Inspecção-Geral de Finanças. Neste momento, ainda não começaram os trabalhos. Creio que já haverá uma resposta positiva da Inspecção-geral de Finanças, mas ainda não estão efectivamente no IGFEJ a trabalhar.

Estão a pensar construir um novo sistema?
Estamos a pensar, para além do que são as manutenções do sistema, introduzir melhorias. Há muitas solicitações, quer a nível interno dos juízes, do Ministério Público, dos funcionários, quer por parte dos utilizadores externos. Temos pedidos dos administradores judiciais para conseguirem ter acesso ao sistema. Este pedido tem um reflexo tremendo nos tribunais do Comércio, onde estes profissionais actuam. Gostávamos de desenvolver algumas situações novas, como a possibilidade de se ter acesso a certidões de forma electrónica. Isso reduz não só o tempo dos funcionários com os processos, mas também os custos com o correio.

Mas será que faz sentido investir num sistema datado?
Porque os tribunais não podem parar dois ou três anos à espera de um sistema novo. Não estamos a afastar a possibilidades de avançarmos para um outro sistema. Temos que nos focar nas necessidades dos tribunais para dar uma resposta mais eficaz ao cidadão. É essa a nossa preocupação. O outro sistema vai sendo paulatinamente pensado em paralelo, as especificações vão sendo levantadas. É um trabalho que, seguramente, vamos começar a encarar logo que estejam reunidos um conjunto de pressupostos que entendemos que são essenciais: a adaptação do sistema à nova estrutura judiciária, introduzir ferramentas de gestão que ajudem os órgãos de gestão das comarcas a detectarem onde há problemas e onde há atrasos. Isto são coisas que o IGFEJ pode fazer já e não pode deixar de fazer à espera de um novo sistema.

Estamos só a falar só de tempo ou também de dinheiro?
Em relação aos investimentos ouvi falar dos números mais díspares. Não sei qual é a fidedignidade desses números, uma vez que não está nenhum estudo feito relativamente às especificações que delimitam o trabalho a fazer. Os últimos governos socialistas tinham um projecto ambicioso, com várias das etapas concretizadas. Foram, por exemplo, contratadas empresas para fazer uma cópia do Citius numa tecnologia mais avançada, que permitiria outras potencialidade, um trabalho que foi pelo menos parcialmente concluído e se chamava Citius Plus. Esse trabalho foi pago pelo dinheiro dos contribuintes e metido numa gaveta.

Não há possibilidade de se utilizar algum desse material?
Seguramente tudo o que puder ser utilizado será utilizado. Há um trabalho muito útil de levantamento das necessidades do sistema feito pelos conselhos superiores, que vai ser revisitado. Mas que já carece de actualização.

Já se renegociaram todas as rendas que a justiça estava a pagar? Qual foi a poupança?
O Ministério da Justiça tem mais de 1.100 instalações. Destas, 325 são arrendadas e temos neste momento um encargo mensal com rendas de cerca de três milhões. A estratégia que foi adoptada foi a de denunciar alguns contratos ou renegociar outros. Este trabalho foi levado a cabo entre 2011 e 2014, tendo nesse período sido conseguido 109 denúncias de contratos, que corresponderam a uma poupança anual de 6,8 milhões. E 140 renegociações que correspondem a uma poupança anual de três milhões de euros. Neste ponto não se vai conseguir muito mais. Alguns arrendamentos têm que subsistir porque têm cláusulas de denúncia que estão muito além no tempo.

Refere-se, por exemplo, ao Campus da Justiça, em Lisboa?
Temos um contrato que só pode ser cessado, sem indemnizações, em 2026. Estamos a falar de uma renegociação que teve uma poupança de 1,3 milhões de euros durante estes três últimos anos. A partir de Maio voltamos a pagar a renda aos valores anteriores [1,150 milhões de euros].

Não é possível renegociar novamente?
Fizemos uma primeira reunião com a empresa, a Norfim, vamos avaliar. Estas possibilidades têm que ser enquadradas no valor actual dos arrendamentos na área em que nos encontramos.

Até quando vai haver tribunais a funcionar em contentores?
Relativamente aos contentores ou aos módulos transitórios existem, neste momento, três tribunais. No de Loures, sede da comarca de Lisboa Norte, já começou a obra. Se tudo correr como o previsto e, até agora não tem havido deslizes nos prazos, contamos que a obra esteja terminada no início de Janeiro do próximo ano. Com a instalação e tudo o resto, no máximo até Março a situação esteja resolvida. Em Faro a situação já está resolvida, a obra foi cumprida dentro do prazo e as pessoas já estão nas novas instalações. E o caso de Vila Real ficará pronto ainda este ano.