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Inclusão social no topo das prioridades mas com muito por fazer

22 out, 2014 • Ana Carrilho/Filomena Barros

A União Europeia defende uma aposta na inclusão social. Mas a realidade portuguesa está longe dos padrões comunitários.

Inclusão social no topo das prioridades mas com muito por fazer

Aumentar a taxa de emprego das pessoas entre os 20 e os 64 anos para 75% e reduzir em 20 milhões o número de pessoas que na União Europeia vivem em risco de pobreza ou exclusão social. São dois dos cinco grandes objectivos definidos na Estratégia “Europa 2020”.

A própria Comissão Europeia os definiu como “ambiciosos mas necessários” para reforçar a competitividade da Europa a 28. Crescimento e Emprego revelam-se, por isso, prioritários e, no fundo, podem promover a inclusão social.

Foi à luz destes objectivos que a União Distrital de Lisboa das Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) decidiu realizar um Seminário para reflectir como é que o sector social/solidário pode responder aos desafios da Estratégia 2020 e como é que pode aproveitar da melhor forma os fundos disponíveis para a inclusão, favorecendo também a melhoria da qualidade do emprego.

A jornalista Ana Carrilho, que acompanhou o Seminário, explica que “não houve quem passasse ao lado da ambição dos objectivos europeus”. Uns para duvidar da sua concretização, outros para manifestar a convicção que vão ser alcançados. Mesmo com um financiamento de muitos milhões de fundos comunitários.
No passado nem tudo correu bem e ainda há quem se pergunte: porquê? É o caso de Maria da Luz Rosinha, antiga presidente da Câmara de Vila Franca de Xira.

Promover o emprego deve ser uma prioridade e segundo a autarca, se o objectivo europeu for atingido, então, em parte, a redução da pobreza também já está resolvida. Mas o centro da discussão foi o papel que as IPSS podem desempenhar. Com a sua intervenção, numa lógica de proximidade com os cidadãos, favorecem a inclusão social, criando emprego e riqueza. É esta a leitura que faz o presidente da União Distrital de Lisboa, José Carlos Batalha. Posição corroborada por Maria da Luz Rosinha que não hesitou em pegar no exemplo que melhor conhece, o de Vila Franca de Xira em que a ligação entre o município e das IPSS é grande.

O novo Quadro Comunitário tem outros critérios e a atribuição de fundos vai orientar-se para os resultados. Mas Maria da Luz Rosinha chama a atenção: “na área social, nem tudo é mensurável”. Por isso, é importante que se faça a distinção entre sector social e sector social solidário, alerta o presidente da União das Instituições Particulares de Solidariedade Social. Algo que a Comissão ainda não faz.

A inclusão social tem garantidos, pelo menos, 1.400 milhões de euros, excluindo o emprego. É quase o triplo dos 580 milhões atribuídos no âmbito do QREN. Mas o Ministro responsável pela coordenação dos fundos, Poiares Maduro, já avisou que o objectivo é “investir mais e com mais inovação nas matérias relacionadas com a inclusão social, nomeadamente Educação e Saúde”. O Fundo de Inovação Social, dotado com 150 milhões de euros, pretende fomentar a sustentabilidade da acção social porque, segundo o Ministro da Segurança Social, Mota Soares,  acaba  por ser mais eficaz quando fica a cargo das instituições que trabalham junto das populações, de norte a sul do país.

O caso da APPC
Projectos inovadores não faltam às instituições particulares de Solidariedade Social e a Renascença foi conhecer um. A jornalista Filomena Barros foi conhecer uma IPSS que, há mais de 20 anos, tem vindo a trabalhar com os fundos comunitários. A Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral, de Lisboa, tem apoios do programa em curso, o POPH – Programa Operacional de Potencial Humano – para formação profissional e 2 projectos inéditos de apoio à família do deficiente.

No caso da formação profissional, para jovens dos 15 aos 30 anos, tem o apoio financeiro do POPH. A Associação recebe 250 mil euros anuais, por transferência do IEFP, o Instituto de Emprego e Formação Profissional. A verba apoia 35 formandos, do curso de assistente administrativo.

O programa POPH está também a financiar 2 projectos inéditos, a nível nacional: um deles, Cuidar dos Cuidadores, que se destina a apoiar os pais e familiares de uma pessoa com deficiência. O outro projecto diz respeito à reabilitação de proximidade. Ambos os projectos estão a ser pagos com financiamento comunitário e terminam em Dezembro, mas a Associação espera ter condições para continuar a dar este apoio às famílias.

A Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral tem 2 mil associados, recebe as quotas, um subsídio da Segurança Social, a comparticipação das famílias, que tem vindo a descer, assim como os donativos de empresas. E fica mais difícil garantir a resposta a todos os pedidos.

Portugal quer fazer parte de uma Europa “mais social”, mas...
À luz da Estratégia 2020, Portugal vai ter, pela primeira vez, um programa operacional de Promoção da Inclusão Social e Emprego. Uma ferramenta financeira que pretende construir uma Europa mais social. Em entrevista à Renascença, o presidente do Comité Económico e Social Europeu, Henri Malosse, defende o crescimento com a criação de emprego para todos. Diz que a estratégia está definida mas é preciso implementar as medidas.

“Eu penso que a Europa precisa de ter crescimento e emprego, mas um crescimento criativo de emprego. Actualmente, não temos criação de emprego e, em alguns países, não temos sequer crescimento. Portanto, temos de recomeçar a economia, para injectar dinheiro na economia real, e não na especulação. Com incentivos, para dar acesso a empréstimos mais baixos para empresas. Para ter uma economia social, precisamos de uma economia saudável… e  uma economia saudável precisa de investimento, financiamento e actividades”, explica.

Henri Malosse lembra que “crescimento inclusivo significa melhor crescimento, com empregos, e crescimento que inclui todas as partes da população (...) porque quando temos parte da população fora da economia isso não é ético, não é ideal do modelo da Europa Social que inclui toda a gente. Mas também não é bom para a economia, porque fica de fora uma grande parte da população, que está infelizmente a aumentar. (...) Portanto, é uma falha para a economia, para o crescimento, para toda a gente”.

Para o presidente do Comité Económico e Social Europeu, com esta estratégia, vamos ter uma Europa mais social em 2020, mas é preciso “começar agora”. “Se começarmos a falar da estratégia mas também a implementar. Porque, até agora, só falámos”.

Como é que Henri Malosse vê o trabalho feito em Portugal? “Eu agradeço a todos os trabalhadores sociais e associações. Graças a eles, têm conseguido manter em Portugal a coesão social, apesar da tragédia do resgate e da austeridade. Mas há um limite (...) e agora esperam da União Europeia, do Governo, sinais concretos e positivos para sair do peso austeridade e para entrar no caminho de mais incentivos, investimentos e crescimento”.