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2015: era uma vez três italianos, um luxemburguês e um britânico

26 dez, 2014 • José Pedro Frazão

No programa “Fora da Caixa” da Renascença, António Vitorino e Pedro Santana Lopes antecipam as figuras que estarão sob os holofotes da actualidade europeia no próximo ano.

2015: era uma vez três italianos, um luxemburguês e um britânico
No programa “Fora da Caixa” da Renascença, António Vitorino e Pedro Santana Lopes antecipam as figuras que estarão sob os holofotes da actualidade europeia no próximo ano.

O presidente do Banco Central Europeu (BCE) estará sob forte pressão em 2015, admite António Vitorino. O antigo comissário considera que as medidas de estímulo financeiro do BCE tardam em dar frutos e “dá” um trimestre a Draghi para mostrar o que verdadeiramente vale.

“O tempo para Draghi está em contagem decrescente. Ele tem três meses úteis à sua frente. Vamos deixar o senhor Draghi ter um Natal Feliz e uma boa entrada no Ano Novo. Mas se dentro de três meses as medidas que ele se propôs adoptar não produzirem uma diferença no plano monetário, estará ele próprio  numa situação muito difícil”, antecipa Vitorino.

Pedro Santana Lopes considera que Draghi foi a figura europeia do ano em 2014 e acredita que o italiano pode fazer a diferença ao lado de outros compatriotas em altos cargos políticos na Europa, como a Alta Representante para a Política Externa, Federica Mogherini, e o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi.

“Este trio mostra que Itália pode representar um rejuvenescimento do modo de estar na forma de fazer política, de intervir na área monetária e financeira, na política externa, na organização de um Estado como no caso de Renzi. Itália, que é berço de tanta inovação civilizacional, podia dar aqui um grande contributo com a sua imaginação e ousadia. E também por ter lá um Estado como o Vaticano, com um Papa como Francisco. A palavra de esperança para 2015 tem a ver com as ideias novas daquela parte da Europa”, considera o antigo primeiro-ministro.

Santana Lopes insiste em classificar a eleição de Renzi como uma janela que se abriu na Europa. “Pelo seu estilo, pelas suas propostas, pelo seu modo de olhar o sistema político. De tudo o que se passou no sistema político na Europa dos últimos meses, a eleição de Renzi era a janela mais promissora. Se se confirma ou não, não sei dizer. Mas a vida não esta fácil para ninguém”, sublinha o antigo líder do PSD.

Juncker à prova
Se António Vitorino considera que a sombra de Merkel foi mais forte que a própria chanceler alemã em 2014, Santana Lopes alerta que “ninguém ficou com a luz de que Merkel se afastou, com o poder que Merkel parece ter perdido. Ela está uma sombra do que foi. Ninguém aproveitou o poder”. Nem David Cameron nem François Hollande, e Renzi ainda não teve tempo para deixar uma marca no ano em que Bruxelas recebeu novos protagonistas nas instituições comunitárias.

O novo presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, ainda tem tudo por provar e e “parte cinco pontos abaixo do que tinha quando foi eleito”, diz António Vitorino.

“O escândalo Luxleaks, queiramos ou não, vulnerabiliza a posição de Juncker. Ele não vai construir uma imagem a partir do sucesso da sua eleição. Tem que recuperar o terreno que perdeu sem ter feito nada, para agora voltar a dourar a sua imagem.”

E quanto tempo dá o antigo comissário ao novo líder do executivo comunitário? “Se Draghi joga o destino a três meses, a credibilidade de Juncker, na lógica do relançamento europeu, joga-se a seis meses”, atira.

De Bruxelas, pode vir mais do que apenas Juncker. “Espero mais do presidente do Conselho Europeu que do presidente da Comissão Europeia, em termos de novidade política. Donald Tusk, aliás, anuncia que vem aí a política de novo à Europa. Vamos ver que presidente do Conselho ele será, ainda agora entrou”, adianta Santana Lopes.

António Vitorino acredita que Donald Tusk será muito mais activo na política externa do que foi Van Rompuy. “O belga teve que gerir o auge da crise do euro, ou seja um processo muito endogâmico, muito virado para dentro. Agora que a situação do euro está, acho eu, resolvida quanto à sua substância, há maior espaço para que o presidente do Conselho Europeu possa olhar para o Mundo e para o papel da Europa no Mundo.”

Sobre Juncker, sobra alguma ironia do antigo ministro socialista no horizonte para 2015. “A política externa do Luxemburgo eram os contratos de impostos. Não há verdadeiramente uma outra política externa do Luxemburgo. Nesse sentido, Juncker vai ter que se focar muito mais na questão da retoma económica, na recriação das condições de confiança e de criação de emprego. Tem que ter a consciência de que não basta adoptar um plano com muito dinheiro - e mesmo assim há dúvidas de que o tenha. É preciso que esse plano tenha uma parte cuja vocação seja produzir resultados a curto prazo. Não é possível continuar a pedir às pessoas  sacrifícios no imediato em torno de bem-aventuranças num horizonte que não se sabe qual é”, assinala António Vitorino.

União sem Reino Unido?
E há ainda as eleições britânicas em 2015, com David Cameron muito pressionado pelos eurocépticos mais radicais.

“A questão britânica vai ser uma questão decisiva durante o ano de 2015. Até às eleições é natural que Cameron guarde as cartas ‘junto ao peito’. Se ele ganhar, vai ter que dizer ao que vem, que novo estatuto quer para o Reino Unido. E vai obrigar os outros a reagirem: a Alemanha, a França e espero que Portugal também não se esqueça de reagir”, comenta António Vitorino.

Já Pedro Santana Lopes acredita que a União Europeia pode sair reforçada em 2015 se fortalecer a sua diplomacia económica.

“Se puser a vertente económica numa parte da sua política externa, acho que isto pode trazer vantagens para a Europa. A Europa precisa de recuperar prestígio, a vários níveis. Interna e externamente, perante os seus cidadãos e fora. Ganhar em qualquer das duas frentes pode ajudar a outra. Se a Europa se conseguir afirmar mais na frente externa e se a diplomacia económica tiver aí alguma presença, pode ajudar as instituições europeias e os cidadãos da Europa nalgum assomo de energia e dinamismo”, aconselha o antigo primeiro-ministro, que volta a pedir um novo despertar europeu. “Parece que está tudo parado”, conclui.

O "Fora da Caixa", que pode ouvir sexta-feira a partir das 23h00, na Edição da Noite, é uma colaboração da Renascença com a Euranet Plus, rede europeia de rádios.