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Os Passos da austeridade

13 set, 2012 • Carlos Calaveiras

Desde que está no Governo, Passos Coelho recuou em algumas promessas eleitorais e aumentou a carga fiscal. Em 15 meses, o custo de vida subiu, os portugueses pagam mais impostos e as contas do país continuam por resolver.

Os Passos da austeridade

Antes de chegar ao poder, Passos Coelho chegou a pedir desculpa aos portugueses por ter viabilizado as medidas de austeridade de José Sócrates. Desde que o líder do PSD formou o Governo, sucederam-se os instantes de austeridade passíveis de desculpa. 

Nos últimos 15 meses, o país confrontou-se com cortes de subsídios, aumento de preços, perdas de poder de compra e subida dos impostos. Os Passos da "austeridade", termo que ensombra a vida pública, começaram em Junho de 2011 com a chegada ao poder da coligação PSD-CDS.

Primeiro objectivo do novo Governo: cumprir a meta do défice em 2011. Para atingir esse desígnio nacional, Passos Coelho não perdeu tempo: a 30 de Junho, anunciou um imposto extraordinário sobre os rendimentos equivalente a 50% do subsídio de Natal acima dos 485 euros, que teria de ser pago em Dezembro.

Poucas semanas depois, o Governo aumentou o preço dos transportes públicos urbanos de Lisboa e Porto - 15% em média. Mais tarde, aumentou o IVA no gás e na electricidade, com a taxa a subir de 6% para 23%.

A 13 de Outubro de 2011, o primeiro-ministro anunciou o corte dos subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos e pensionistas com salários superiores a 1.000 euros. Mais tarde, a medida foi alvo de ajuste: o corte passou a ser progressivo entre os 600 e os 1.100 euros e integral daí em diante.

Passos, já depois de ter anunciado a sobretaxa, quebrava uma promessa eleitoral: durante a campanha, tinha dito que não ia cortar os subsídios. Cortou mesmo.

"Quando fui eleito primeiro-ministro, nunca pensei que tivesse de anunciar ao país medidas tão severas e tão difíceis de aceitar", referiu o chefe de Governo na mesma altura em que anunciou mais meia hora de trabalho para o sector privado (medida que entretanto caiu) e o fim de alguns feriados (medida que entra em vigor em 2013).

Certo é que as mexidas nas leis laborais, que incluem o corte nos feriados, também encolheram as remunerações, nomeadamente no valor pago a quem trabalha em dias de feriado (que perde igualmente o direito a folga). As regras das indemnizações também mudaram, acabando por encurtar alguns dos valores a pagar.

A viragem que não surgiu
Já em Janeiro, Passos Coelho disse no Parlamento que 2012 era "o ano da viragem económica" - frase que já foi obrigado a corrigir. Mas, e como é tradição em todos os inícios de ano, seguiram-se uma série de aumentos em vários sectores.

O Governo fez uma reestruturação dos produtos sujeitos a IVA, reforçando a taxa intermédia de 13% e passando vários produtos para a taxa máxima de 23%. A restauração também subiu de 13% para 23%, naquela que foi a alteração mais polémica.

Entrou também em vigor um conjunto de novas medidas que levaram a cortes na saúde (as despesas passaram a ser dedutíveis em sede de IRS só em 10%) e na habitação (as despesas são dedutíveis apenas em 15%). Muitas deduções e benefícios fiscais em sede de IRS e IRC foram reduzidas ou eliminadas e as próprias taxas de retenção foram mexidas.

O preço da electricidade voltou a aumentar no início de 2012 - mais 4% na factura mensal. O imposto sobre veículos (ISV) para os automóveis ligeiros de passageiros sofreu um aumento médio de 6,4%, o imposto municipal sobre imóveis (IMI) teve um agravamento e o imposto sobre os cigarros subiu de 45% para 50% e a taxa de cigarrilhas e charutos aumentou de 13% para 15%.

A 1 de Fevereiro, os preços dos transportes públicos aumentaram mais uma vez, com uma subida média de 5%.

Com excepção das reformas mais reduzidas, as pensões não foram actualizadas nos últimos dois anos. Os reformados também pagaram a sobretaxa em 2011 e perderam os dois subsídios em 2012. Para o ano, já sabem também que as pensões acima de 1.500 euros vão levar cortes até 10%.

As regras do subsídio de desemprego também foram revistas, os montantes e a duração máxima foram cortados e foram também criadas novas regras de atribuição do rendimento social de inserção. 

Além do cancelamento de grandes projectos de infra-estrutura, como o novo aeroporto de Lisboa ou o comboio de alta velocidade, o Orçamento do Estado para este ano contemplava um corte de 42% no investimento público.

Todos os trabalhadores vão perder dinheiro em 2013
O ministro das Finanças, Vítor Gaspar, anunciou a 30 de Abril – já depois de Passos o ter dito à Renascença -, que o Governo previa que os subsídios de férias e de Natal começassem a ser repostos aos pensionistas e funcionários públicos a partir de 2015 (25% por ano). Mas, em Julho, o Tribunal Constitucional declarou inconstitucional a suspensão dos dois subsídios.

Esta decisão do Tribunal, com efeitos em 2013, levou o primeiro-ministro a anunciar, a 7 de Setembro, um aumento na contribuição de todos os trabalhadores para a Segurança Social (de 11% para 18%), de forma a recuperar os dois mil milhões de euros previstos com o corte dos subsídios.

Assim, todos os trabalhadores vão ter menos dinheiro para gerir em 2013: as perdas são superiores a um salário líquido, isto tendo em conta o que se sabe actualmente - o Governo ainda vai anunciar mais detalhes a propósito deste aumento das contribuições para a Segurança Social. Já as empresas viram baixar a sua contribuição de 23,75% para os mesmos 18%.

Quatro dias depois do anúncio de Pedro Passos Coelho, foi a vez do ministro das Finanças falar ao país. A 11 de Setembro, Vítor Gaspar anunciou que a "troika" vai dar mais tempo a Portugal e que as metas do défice foram revistas: 5% e não 4,5% em 2012, 4,5% e não 3% em 2013 e 2,5% em 2014. Ou seja, a "troika" deu mais um ano para o défice ficar abaixo dos 3%, mas não vai dar mais dinheiro.

Apesar desta revisão das metas, Vítor Gaspar apresentou mais uma série de medidas de austeridade, com os pensionistas a serem os mais prejudicados. Segundo o Governo, vai ser aplicada uma "redução adicional às pensões correspondente à redução aplicada aos funcionários públicos em 2011". Na prática, o corte vai ser entre 3,5% e 10% para as pensões superiores a 1.500 euros ilíquidos. A medida entra em vigor em 2013 e soma-se à perda de dois subsídios.

Os trabalhadores a recibos verdes também vão ser penalizados: a contribuição para a Segurança Social é agravada de 29,6% para 30,7%. A taxação de imóveis de elevado valor (um milhão de euros ou mais) e de outros bens de luxo vai crescer, tal como a tributação sobre os rendimentos de capital.

Quinze meses depois da chegada de Passos ao poder, a austeridade unificou os quadrantes políticos: da esquerda à direita, não faltam vozes indignadas. E quase ninguém ouve falar de esperança.