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Cruz Vermelha grega. "Cenário dramático" com "pessoas desesperadas"

02 set, 2015 • André Rodrigues

Porta-voz da organização diz à Renascença que se esgota o espaço para acolher os milhares de refugiados oriundos de cenários de conflito e pede celeridade às autoridades europeias.

Cruz Vermelha grega. "Cenário dramático" com "pessoas desesperadas"
Mais de 4200 refugiados ou migrantes chegaram à Grécia só na madrugada desta quarta-feira. Só numa semana, a Grécia recebeu 23 mil pessoas, mais 50% do que nos sete dias anteriores. Na Hungria cerca de mil refugiados permanecem concentrados à porta da estação ferroviária de Budapeste. Em Calais, à entrada do Eurotúnel (que permite chegar de comboio ao Reino Unido), um grupo de migrantes impediu a circulação ferroviária durante várias horas.

A Cruz Vermelha na Grécia classifica a vaga de refugiados que tem dado entrada no país como “um cenário dramático”. Só na madrugada desta quarta-feira, mais de 4.200 pessoas chegaram ao porto de Pireu nas proximidades de Atenas.

A porta-voz da Cruz Vermelha em Atenas, Ketty Kehayioylou, diz, em declarações à Renascença, que o país já não tem mais capacidade para receber refugiados. “É uma crise humanitária de contornos dramáticos.”

“As ilhas não têm capacidade para receber estas pessoas. Temos apenas três centros de acolhimento em três ilhas. E temos quase 200 mil pessoas a chegarem à nossa costa desde o início do ano. Estamos a falar de estruturas que não dispõem das condições mínimas para as acolher”, sublinha Kehayioylou.

“Por outro lado, no território continental também não estamos preparados para receber refugiados”, acrescenta.

A porta-voz da Cruz Vermelha na Grécia diz que não há mais locais para acolher estes refugiados, todos oriundos de cenários de conflito. “Mais de 90% destas pessoas são sírios, afegãos, iraquianos, somalis; pessoas que fogem da guerra e da perseguição. Temos apenas 1.100 centros de acolhimento para requerentes de asilo. E poucos mais destinados a acolher pessoas sem-abrigo.”

A Grécia enfrenta uma vaga de refugiados que cresce a cada semana. Só nos últimos sete dias, a Frontex, agência de controlo de fronteiras da União Europeia, contabilizou a entrada de 23 mil pessoas em solo grego, mais 50% em relação ao número registado na semana anterior.

No total, em oito meses, mais de 160 mil migrantes e refugiados chegaram à Grécia, um número que já ultrapassa o total do ano passado.

Enquanto isso, o governo de Atenas lembra que não tem capacidade para receber mais refugiados. O presidente grego já pediu ao homólogo francês para que esta questão seja discutida ao mais alto nível, e também o executivo interino da Grécia deverá reunir de emergência esta quarta-feira para discutir este assunto.

Gregos dividem-se entre a crise e a solidariedade
Na opinião pública grega existe uma dualidade de sentimentos. Ketty Kehayioylou fala de uma sociedade dividida entre a preocupação por causa da crise que afecta o dia-a-dia das pessoas e a solidariedade para com os refugiados. “Há muitos voluntários e pessoas que alteraram as suas vidas só para ajudar, sobretudo nas ilhas gregas.”

“De uma maneira geral, os gregos não estão zangados com esta entrada maciça de refugiados no país, apesar de termos um partido de extrema-direita que tem ganho alguma projecção na opinião pública por causa do discurso anti imigração”, refere.
 
“Penso que, por causa da crise política e da crise económica, este tema dos refugiados não tem sido encarado com tanta prioridade. Embora apareça mais nos alinhamentos dos noticiários, não assume as mesmas proporções que a crise política e económica tem tomado nos últimos tempos.”

Desde Janeiro, mais de 350 mil pessoas chegaram à Europa depois de atravessarem o Mediterrâneo na travessia da esperança, onde mais de 2.500 migrantes e refugiados acabaram por morrer. “Estamos a falar de pessoas desesperadas. Por isso a Europa deveria ser mais célere na criação de mecanismos legais. Temos 200 mil pessoas a chegar à Grécia.

“Temos visto a agenda europeia para a imigração - é uma gota no oceano”, descreve a responsável. “Ainda por cima, nem sequer se materializou, as pessoas ainda não abandonaram os centros de acolhimento, nem sequer foram seleccionadas. Tem de ser tudo muito mais rápido.”