Emissão Renascença | Ouvir Online

Valter Hugo Mãe: "Construímos uma geração muito cobarde"

12 abr, 2015 • Maria João Costa

No encerramento do Festival Fronteira, em Castelo Branco, o autor de "A Desumanização" criticou aqueles que se “demitem das coisas” e não dizem o que pensam.

Valter Hugo Mãe: "Construímos uma geração muito cobarde"

Depois de ter confessado que quando chegou a Castelo Branco lhe indicaram a loja da “D. Susana” onde foi comprar seis queijos, Valter Hugo Mãe mostrou-se espantado com a cidade que o acolheu para o encerramento da terceira edição do Festival Fronteira. O auditório da Escola Superior de Educação encheu-se para ouvir o autor.

Entrevistado pelos moderadores Pedro Vieira e Tito Couto, Valter Hugo Mãe acabou a falar do país actual e a afirmar, de forma critica, que hoje as pessoas “demitem-se das coisas” e não dizem o que pensam, “preferem que os outros se queimem”. O escritor que veio das Caxinas, em Vila do Conde, até Castelo Branco para esta conferência concluiu que “construímos uma geração muito cobarde, habituada à liberdade democrática, mas sem capacidade de a defender”.

Perante um auditório cheio, Valter Hugo Mãe falou das várias áreas artísticas em que trabalha. Além da escrita, dedica-se também à música e ao desenho. “Todas as transgressões que faço nas artes, ou em outras áreas, têm a ver com ansiedade de poder aprender alguma coisa com os outros”, afirmou e acrescentou: “Não consigo ser passivo e abato as fronteiras, mas o único território onde consigo estar é na literatura”.

O escritor confessa que cresceu sem saber o que iria ser, sonhava ser padeiro, mas hoje tem outro sonho. Quer entrar num filme. Diz que não precisa do papel de galã, basta-lhe “estar lá a abrir uma porta”.

Figurante é coisa que não é na arte da escrita. Este protagonista da literatura contemporânea portuguesa, vencedor do Prémio José Saramago, explicou ao público albicastrense que “a literatura acontece-me por causa da poesia e poesia é onde está a extremidade da palavra”. Para Valter Hugo Mãe, “os romances acedem à condição de arte quando roubam à poesia as suas caracteristicas”.

Já foi editor de poesia na desaparecida editora Quasi, admite que gostava de “encontrar uma espécide de ouro que é feito de palavras”. Essa busca de novos talentos não a perdeu. Ainda hoje recomenda aos editores nomes em que acha que vale a pena apostar. Mas admite que “nem sempre é fácil a entrada de novos autores em grandes grupos”. Termina dizendo: “A minha costela de editor ficou-me”.

Em declarações no Festival organizado pela Câmara de Castelo Branco, Valter Hugo Mãe explicou que tem “recebido propostas para alguns empregos. Desde dirigir auditórios e teatros até ser vereador da cultura”. Mas o autor explica que “não é possível neste momento, por causa da exigência da escrita.”

Admite que tem de escrever com "todo o empenho possível", mas na sessão de encerramento do Festival Fronteira disse que “escrever é cada vez mais dificil”. Respondendo a uma pergunta do público, Valter Hugo Mãe explicou que aquilo que quer “não tem a ver com a mediania”, o que quer é a “superação constante e isso é difícil”.