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Fora da Caixa

António Vitorino: Varoufakis é a "estrela rock" da Europa a tratar "coisa de chefes"

06 fev, 2015 • José Pedro Frazão

António Vitorino e Santana Lopes analisam o périplo do primeiro-ministro e do ministro das Finanças da Grécia por várias capitais europeias depois da vitória eleitoral do Syriza.

António Vitorino: Varoufakis é a "estrela rock" da Europa a tratar "coisa de chefes"
É o que diz António Vitorino. Os comentadores do Fora da Caixa analisam o périplo do primeiro-ministro e do ministro das Finanças da Grécia por várias capitais europeias depois da vitória eleitoral do Syriza.
Foi uma entrada cheia de estilo do novo governo grego na Europa. A par de Alexis Tsipras, os europeus habituam-se agora a outra figura de proa na negociação grega. Yannis Varoufakis esteve reunido com diversos homólogos e responsáveis económicos europeus e deixou marca.

"O 'prémio desta semana' vai, sem dúvida, para a política de comunicação do novo governo grego. Acho que foi aí que eles apostaram tudo. Quantos nomes de ministros das Finanças dos 28 estados membros sabem-se de cor? Dois ou três. Varoufakis é hoje, sem dúvida nenhuma, a 'rock star' da política europeia", diz António Vitorino.

Para o "presidenciável" socialista, o comportamento e a gestão mediática do novo ministro grego das Finanças "é mais de uma estrela rock que está a fazer a promoção do próximo concerto do que propriamente de alguém que tem uma dívida de 317 mil milhões às costas".

Pedro Santana Lopes graceja com a metáfora escolhida por Vitorino: "Não sei se a música é muito afinada. É pesada, hard rock, heavy metal!".

O antigo primeiro-ministro diz que, depois desta "semana do périplo", os novos governantes gregos "precisam de se sentar. Andam à procura de onde se devem sentar para negociar. Com certeza não vai ser em França ou no Reino Unido, mas, entre Berlim e Bruxelas, têm que se sentar. Se esse lugar é o Conselho Europeu? Talvez seja o mais adequado".

Atenas-Berlim-Atenas
O debate sobre a situação grega e a eventual renegociação da dívida pode centrar-se numa conversa circunscrita a Berlim e Atenas. Esse risco existe, reconhece António Vitorino: "A questão da relação bilateral entre a Alemanha e a Grécia é fundamental, como é evidente. Mas não podemos encarar a questão como se tudo dependesse de Berlim – se Berlim quiser, sim; se não quiser, não. Não é assim".

E elabora: "A estabilidade da zona euro passa por encontrar uma solução para a Grécia. Desde logo, esse é o interesse português. Tenhamos consciência de que, se alguma coisa descarrila em relação à Grécia, estamos numa posição particularmente vulnerável. Por isso, evitar uma corrida aos bancos na Grécia é fundamental", sustenta o antigo comissário europeu.

Vitorino identifica a mudança de algumas posições do governo grego ao longo da última semana e credita um ponto a favor do novo poder em Atenas. "Deu um sinal de flexibilidade na sua posição. Do ponto de vista da grande opinião pública, quem é que não mudou a sua posição em nada? Os alemães. Penso que isso é exactamente o que os gregos querem. Não se deixarem isolar e, ao mesmo tempo, criarem a ilusão de que quem está isolado são os alemães".

Santana Lopes, que durante seu percurso académico viveu e estudou na Alemanha, não encontra sinais de abertura na posição alemã, incluindo nos sectores mais próximos do SPD (social-democratas, congéneres do PS, em coligação no poder com os conservadores da CDU, de Merkel).

Vitorino concorda, mas sublinha que "também já nos habituámos no passado a que [Wolfgang] Schäuble [ministro das Finanças alemão] faça de polícia mau. E a senhora Merkel tem sido de uma enorme prudência nas palavras que tem usado. A crise do euro já mostrou que é uma coisa que os alemães chamam 'chefsache’. Uma coisa de chefes, que só ao mais alto nível é que é tratada".

Bruxelas-Frankfurt-Bruxelas
E, no entanto, a Europa move-se ainda demasiado devagar nas estruturas políticas, lamenta Pedro Santana Lopes.

O "presidenciável" social-democrata tem criticado nos últimos meses a lentidão dos processos de resposta política à crise por parte das autoridades de Bruxelas. "Estou algo preocupado [com a Grécia], mas, se quer que lhe diga, estou mais preocupado com o tempo que a União Europeia anda a perder. Continuamos de assunto em assunto, o que naturalmente gera algum bloqueio no desenvolvimento das políticas que a União Europeia precisa".

Para Santana, as recentes decisões do Banco Central Europeu foram cartadas de alguma aproximação estratégica de Mario Draghi a Angela Merkel.

Já Vitorino considera que "os riscos de Draghi foram calculados. Sessenta mil milhões de euros de ajuda extraordinária é quase todo o dinheiro que a troika emprestou a Portugal. Não é uma quantia pequenina. Se com 60 mil milhões não são dadas garantias de estabilidade ao sistema bancário grego..."

O programa "Fora da Caixa" é uma parceria Renascença/Euranet, para ouvir todas as sextas-feiras depois das 23h00