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Um longo percurso de “perseguição” judicial

22 nov, 2014 • Eunice Lourenço

Os casos e investigações têm sido uma constante na carreira de José Sócrates.

Um longo percurso de “perseguição” judicial

Licenciatura, Freeport, Monte Branco… ao longo dos anos o nome de José Sócrates foi aparecendo ligado a vários casos e investigações judiciais. O antigo primeiro-ministro sempre respondeu ao ataque, considerando que as suspeitas por si eram “canalhices” e manobras de combate político. A sua detenção para interrogatório, no âmbito de um processo por suspeita de fraude fiscal, fá-lo entrar para uma lista não recomendável de ex-primeiros-ministros detidos, que inclui Berlusconi e Sarkozy entre outros.

Em 2005, à beira de se tornar primeiro-ministro e com a possibilidade de uma maioria absoluta à espreita, salta-lhe o caso Freeport ao caminho. A suspeita era de corrupção e dizia respeito aos tempos em que tinha ocupado a cadeira de ministro do Ambiente na governação de António Guterres. Sócrates teria feito um decreto-lei à medida para que pudesse ser aprovada a construção do Freeport de Alcochete, um mega-espaço comercial.

As eleições de Fevereiro de 2005 deram-lhe uma maioria absoluta histórica para o PS, mas Sócrates teve o caso Freeport a acompanhá-lo para além dos seis anos em que foi primeiro-ministro. Só em Julho de 2012, o colectivo de juízes absolveu Manuel Pedro e Charles Smith, mas ainda assim mandou extrair uma certidão do processo por considerar que, ao longo do julgamento, houve fortes indícios de pagamentos dentro do Ministério do Ambiente.

Por essa altura, já Sócrates tinha perdido a liderança do Governo e do PS e tinha tido um outro caso a manchar-lhe a imagem e a reputação e a provocar irritação do “animal feroz”: a questão da sua licenciatura, a suspeita de não teria sido alcançada da forma mais conforme às normas e preceitos universitários. O caso começou em 2007, envolveu até o Parlamento. Na altura, a Universidade Independente – onde Sócrates teria concluído a licenciatura a um domingo – esteve sob investigação por várias irregularidades e acabou por encerrar.

Já acossado por vários casos e num clima de confronto com quem questionasse a sua idoneidade, José Sócrates envolve-se noutra polémica e o seu nome aparece ligado a mais um processo: a investigação de tentativa de condicionamento político de negócio na tentativa da PT comprar a TVI. Esta investigação foi paralela ao caso Face Oculta, que envolve vários nomes socialistas, entre os quais o ex-ministro Armando Vara, nomeado por Sócrates para administrador da Caixa Geral de Depósitos.

O fim da imunidade e as perguntas da Renascença
Em 2009, José Sócrates perde a maioria absoluta, em 2011, perde o país e o PS. E nessa noite eleitoral de 5 de Junho de 2011, Sócrates anuncia que não ocupará o lugar de deputado para que tinha sido eleito. A Renascença pergunta-lhe se não receia que essa derrota e as decisões, abdicando da imunidade parlamentar, abram caminho a novos processos judiciais. Responde que confia na separação entre a política e a justiça, num Estado de direito.

O ex-primeiro-ministro vai, então, estudar para França, mas pouco depois começam a surgir novos casos ou a regressar questões antigas, como o património da mãe.

Em 2012, o "Correio da Manhã" noticia que o Ministério Público tem em curso junto do Tribunal constitucional uma fiscalização aos rendimentos obtidos por José Sócrates enquanto primeiro-ministro. Passado algum tempo, as suspeitas começam a ser sobre a casa de Paris e as condições para manter a vida que leva na capital francesa. Sócrates justifica que fez um empréstimo junto da Caixa Geral de Depósitos para estudar.

Estudou, fez uma tese sobre tortura e regressou. Primeiro, à RTP, depois ao país. E, de forma mais ou menos cíclica, foram surgindo notícias de investigações, suspeitas, referências a processos.

Em Julho deste ano, já com o caso Espírito Santo a dar as primeiras explosões, a revista Sábado chegou a noticiar que o antigo primeiro-ministro podia ser detido no âmbito de uma investigação extraída do caso Monte Branco, mas na altura a procuradoria fez um comunicado recusando qualquer investigação a Sócrates no âmbito desse processo. E o próprio ex-primeiro-ministro foi de imediato à RTP dizer que era uma “canalhice” tentar envolvê-lo num processo judicial. Sócrates garantia, na altura, que usaria todos os meios à sua disposição. E que o facto de já não ter cargos públicos o deixava mais livre para se defender.

Mas nem assim as suspeitas e os rumores cessam. E as respostas não eram claras. A 30 de Julho, a Renascença perguntou à Procuradoria se haveria outros processos em que estivesse sob investigação. A resposta foi “nada a acrescentar à informação já prestada”. Passados uns meses, a 7 de Outubro e face à existência de novos rumores sobre uma iminente detenção do ex-primeiro-ministro José Sócrates, a Renascença renovou as perguntas. E a Procuradoria renovou a resposta: “nada a acrescentar à informação já prestada”.

Agora, a confirmação de que há fogo, ou pelo menos fumo mais denso: uma nota da procuradoria-Geral da República confirma a detenção do ex-primeiro-ministro para interrogatório e a sua constituição como arguido numa investigação que envolve crimes de fraude fiscal, branqueamento de capitais e corrupção.