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Vitorino revela: compromisso europeu entre austeridade e crescimento está a ser negociado

25 out, 2014

No programa “Fora da Caixa”, da Renascença, o antigo comissário europeu pede medidas de estímulo à economia que não agravem a dívida. Santana Lopes diz que não é impossível ter equilíbrio orçamental e crescimento económico.

O antigo comissário europeu revela que há esforços em curso para encontrar um compromisso para evitar o confronto entre defensores de austeridade e de crescimento. “A Europa precisa de pôr termo a esta esquizofrenia entre os ‘austeritários’ e os ‘crescimentistas’ porque já se percebeu que o debate se colocar nesses termos vai caminhar para o impasse. As indicações que vou tendo é que algumas pessoas, de um lado e do outro, com bom senso, estão a tentar encontrar uma solução de compromisso que evite um afrontamento”, adianta o comentador socialista.

Santana Lopes tem vindo a defender “uma ruptura controlada e pouco compromisso”. Mas o primeiro-ministro acaba por ceder ao argumento do seu parceiro de debate. “Aqui o António Vitorino tem toda a razão: não podemos continuar com esta dicotomia entre os da austeridade e os do crescimento. Temos que ter contenção e equilíbrio orçamental, mas também crescimento. E temos que ver quais os caminhos que permitam os dois. Com certeza é difícil, mas é possível, não é impossível”, sustenta o antigo primeiro-ministro.

Reformas demoradas
Foi mais uma ronda de recados de Mário Draghi. O Presidente do Banco Central Europeu foi chamado à mesa dos chefes de estado e de governo da zona euro, reunidos esta sexta-feira em Bruxelas. Insistiu na necessidade de reformas estruturais concretas e credíveis e disse que ter esperança não é uma estratégia. António Vitorino lembra que as reformas não têm um retorno imediato. “ Não se pode criar a expectativa de que, com reformas estruturais, o crescimento está aí amanhã ao virar da esquina. Vai ter que haver medidas de estímulo à economia selectivas que não agravem a situação da dívida. Esse é o ponto. Todos os países são sobre endividados, só que uns financiam-se melhor que outros”, sublinha Vitorino que recorda que a Alemanha não respeita esse critério de Maastricht, fazendo uma estratégia de redução do défice para ir, progressivamente, eliminando a sua própria dívida pública.

Anuncia-se um pacote de investimento público e privado de 300 mil milhões de euros para os próximos três anos. Jean-Claude Juncker promete apresenta-lo até ao Natal e Santana Lopes tem boas expectativas. “Não acredito que a União Europeia, os altos funcionários, os quadros que preparam decisões, para não falar dos responsáveis políticos, não tenham tirado lições em relação aos anos que passámos”, confessa o antigo primeiro-ministro.

O que dirá a história de Van Rompuy
No momento da transição politica em Bruxelas, Santana anota que os presidentes cessantes da Comissão e do Conselho Europeu, Durão Barroso e Herman Van Rompuy partilharam um perfil discreto nos seus mandatos. “ Acabaram por constituir uma dupla muito reservada ou pouco mobilizadora, mas foi também ‘fruta da época’. Era difícil ser mobilizador num tempo como aquele que temos atravessado”, sublinha o antigo chefe de governo que lavra um elogio ao belga que agora abandona a presidência do Conselho Europeu. “O balanço do seu mandato é francamente positivo, apesar dos tempos difíceis. Ele foi um factor de união, uma instância de tranquilidade para os ‘passageiros deste comboio europeu em alta velocidade’, mas um pouco sem rumo, como aconteceu nos últimos anos. Ele foi alguém com credibilidade suficiente para ‘colar os cacos’ em que muitas vezes estava a realidade europeia destes tempos difíceis”, ressalta o comentador social-democrata.

António Vitorino exalta a discrição de Van Rompuy que se transformou em grande eficiência num momento em que a crise financeira caiu sobre os ombros do Conselho Europeu. “ Rompuy teve um papel muito importante junto dos chefes de Estado e de Governo que tinham interesses e posições muito distintas. Não há precedente na história da União Europeia, numa situação de crise tão grave, que tenha sido possível manter todos os países agregados e definir uma linha de rumo de resposta à crise, apesar de todas as dificuldades, dos atrasos, até às vezes das hesitações. Isso, em larga medida, é mérito do senhor Van Rompuy. E é tanto mérito quanto ele até deixou o palco para outras entidades. E a senhora Merkel, naturalmente, não se escusou a ocupar esse palco”, sustenta António Vitorino.

Novas caras
Sai Rompuy, entra Donald Tusk para acompanhar Juncker nas novas instituições europeias. “Eu acho que voluntarismo não vai faltar, esperemos que não seja inimigo da eficácia”, atira Santana Lopes que admite o cargo de presidente do Conselho Europeu pode ser elevado a outra posição. “ Não sei se mais eficaz, isso é difícil de medir, mas mais luminoso será com certeza. Se mais iluminado, o tempo o dirá”, graceja.

António Vitorino considera que o ex-primeiro-ministro polaco “ terá, talvez, maior apetência por acção externa, coisa que Van Rompuy não tinha. Nem provavelmente teve muitas oportunidades, porque teve que tratar da ‘cozinha interna’, que é salvar o euro, o que não é pequena coisa. Admito que, agora que a fase mais aguda, em que se punha em causa o euro, está ultrapassada, o presidente do Conselho Europeu possa ter mais margem de manobra para se dedicar à política externa”. Ser polaco, nesse particular, tem a sua importância, remata Vitorino.

O “Fora da Caixa”, que pode ouvir à sexta-feira a partir das 23h00, na “Edição da Noite”, é uma colaboração da Renascença com a EURANET PLUS, rede europeia de rádios.