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“Depende da Europa evitar segundo resgate”, diz Silva Peneda

19 out, 2014

“Até dá azar falar da hipótese”, afirma o presidente do CES. Já Carvalho da Silva sustenta que no OE2015 “só há cenouras”.

“Depende da Europa evitar segundo resgate”, diz Silva Peneda
“O orçamento tem riscos como têm todas as previsões do futuro”, afirma Maria Luís Albuquerque.

A ministra das Finanças, citada no "Diário de Notícias" deste sábado, disse ter dificuldade em abordar os riscos na execução deste Orçamento do Estado para 2015 quando comparado com os três exercícios anteriores, mas reconhece que existem, sim, riscos, mesmo estando Portugal agora melhor posicionado.

No limite o risco maior pode implicar um segundo resgate? Silva Peneda responde à pergunta no Conversas Cruzadas deste domingo.

“Em política não podemos dizer que determinados cenários não se repetem. Eu não desejaria que isso acontecesse. Acho que até dá azar falar nessa hipótese” diz o presidente do Conselho Económico e Social.

“Espero que haja juízo por parte das instâncias europeias. Fundamentalmente depende da Europa. A nossa capacidade de manobra é muito diminuta. Este OE 2015 prova isso”.

“Portugal cumpriu a receita que lhe foi imposta. Essa receita estava errada. Está demonstrado. Seria muito mau que o país fosse agora novamente vítima do resultado de receita imposta por estranhos. Espero que a política europeia possa ser modificada”.

Há risco de novo resgate? Carvalho da Silva responde. “Se a política europeia continuar na mesma linha. Se tivermos um governo que continua a submeter-se e a subscrever o pior da receita europeia.”

“Se não se acelerar a resolução dos problemas políticos: não só o OE do próximo ano, mas sim quanto mais depressa se realizarem eleições. Eleições suportadas por um debate profundo e envolvimento da sociedade portuguesa em que sejam abordadas a questão do euro e da renegociação da dívida”, defende o sociólogo.

“Se não evitarmos o descalabro no sector público e privado quer por esgotamento quer por outros aspectos é evidente que – desastradamente – vamos para lá, para um segundo resgate”, adverte.

Carvalho da Silva: “Eleições, depressa!”
Legislativas em Junho ou Julho? Silva Peneda não se opõe. “Não vejo nenhum inconveniente. Já sei que o PSD não vai gostar que faça este tipo de observação. Sinceramente não sei o que se ganha de opções de voto em três meses".

“A decisão do eleitor está decidida antes do Verão, em Junho, Julho. Ser em Julho ou Outubro não vejo a diferença”, indica.

"Por outro lado, há a vantagem de ter um orçamento preparado de acordo com o calendário do ano civil o que é positivo. Posso mudar de opinião, mas analisando todos os argumentos era favorável a que as eleições tivessem lugar antes do Verão”, refere Silva Peneda.

Oportunidade para ‘recalendarizar’ o ciclo eleitoral ou necessidade política? Carvalho da Silva é claro.

“Já que o Presidente da República resistiu, resistiu à não substituição do governo coloca-se agora a premência de antecipar eleições e de se gerar na sociedade portuguesa um debate profundo em que todos dêem um contributo para aumentar a capacidade do entendimento da sociedade”, sustenta o investigador da Universidade de Coimbra.

OE 2015 é realista?
E quanto à proposta de Orçamento do Estado para 2015? O presidente do CES diz-se limitado na análise.

“Do ponto de vista institucional estou algo inibido de fazer comentários muito aprofundados. Sendo o Conselho Económico e Social, uma instituição que vai formalmente emitir um parecer sobre o OE destinado à Assembleia da República não faria sentido tentar antecipar decisões que vão ser tomadas pelos conselheiros a 4 de Novembro”, refere Silva Peneda.

“Nessa altura sentir-me-ei mais á vontade para falar sobre estas questões, mas numa perspectiva meramente factual, não pisando a linha vermelha que enunciei, este Orçamento representa o mesmo padrão dos últimos anos”.

“Tem a ver com uma política errada, se calhar, a responsabilidade não é toda do governo português, mas do directório europeu.”

“Ora hoje é praticamente reconhecido por todos que esta ideia se baseou num diagnóstico falso da crise”, diz o presidente do CES.

Carvalho da Silva não poupa nas críticas. “É um OE que sobreavalia o crescimento económico, à luz do que é a realidade: ainda esta semana tivemos dados sobre o que se passa na Europa, uma situação débil, e sobre a quebra do crescimento económico no plano nacional.”

“Há uma previsão de crescimento que não é atingível. Há um crescimento da receita fiscal absolutamente inflacionado. Não é possível. Ainda por cima gozando com os contribuintes dizendo, ‘se isto for cumprido vocês serão ressarcidos’. Neste orçamento só há cenouras: estão mesmo a tratar-nos como incapazes”, sustenta o sociólogo.

Silva Peneda: “OE2015 tem pouco a ver com o crescimento”
Silva Peneda diz recusar juízos valorativos, só lê números. “Os impostos sobre a produção e a importação aumentam quase 8% enquanto os impostos sobre património e rendimento aumentam apenas 1,3%. Isto dá ideia da componente da receita. Há claramente um agravamento fiscal. São números. São factos. Nem sequer são juízos de valor”, indica.

“Na despesa, as alíneas que descem significativamente são o subsídio de desemprego, 10,1% e a educação, no básico e secundário, 11%. São valores a desenhar, de forma objectiva, a opção política deste orçamento. Um orçamento é um instrumento que reflecte as opções políticas de um governo”, nota o ex-ministro.

“Portanto, mais uma vez, este orçamento, em coerência com orçamentos passados, faz do combate ao défice o seu principal objectivo. É um orçamento que tem muito pouco a ver com o crescimento económico. Vem na linha dos orçamentos anteriores”.

“Admito, neste sentido, que as observações do CES sejam na linha das feitas em orçamentos anteriores”, deixa escapar Silva Peneda.

Carvalho da Silva questiona a repartição do esforço fiscal.

“O problema mais de fundo é o da distribuição da carga fiscal”, afirma.

“Temos uma série de agravamento de impostos para o próximo ano. O agravamento no património e riqueza é de 1,3%. Estamos a brincar? Entretanto, temos a notícia de mais 10 mil milionários num só ano. Onde é que se deve fazer o esforço?”.