Tempo
|

O que pensa Sampaio da Nóvoa sobre a austeridade, as desigualdades e os políticos?

06 abr, 2015 • João Carlos Malta

Há quem já dê como certa a sua candidatura à Presidência. A Renascença leu entrevistas e discursos do ex-reitor da Universidade de Lisboa. Estas são as suas ideias sobre Portugal, o ensino, as desigualdades, a Europa e os políticos. E sobre si mesmo.

O que pensa Sampaio da Nóvoa sobre a austeridade, as desigualdades e os políticos?
António Sampaio da Nóvoa, 61 anos, é um minhoto de Valença. Ganhou notoriedade no tempo em que foi reitor da Universidade de Lisboa, entre 2006 e 2013, e através dos vários discursos (alguns deles tornaram-se virais nas redes sociais) que foi fazendo normalmente em reuniões ou colóquios ligados a partidos de esquerda.

Ao nível académico, fez dois doutoramentos: um em Educação na Universidade de Genebra e outro em História na Sorbonne.

Entre 2013 e 2014 esteve em Brasília, numa missão internacional da Unesco junto do governo brasileiro e como professor visitante na Universidade de Brasília. É director da iniciativa Politicas Públicas Universidade Lisboa, desde Setembro de 2014.

Segundo o "Expresso" de sexta-feira, estará para breve a apresentação de Sampaio da Nóvoa uma candidatura à presidência. No dia seguinte, em entrevista ao "Jornal de Notícias" , Sampaio da Nóvoa disse: "não é sério dizermos que somos candidatos em Outubro para umas eleições que acontecem dois meses depois ".

Recorrendo a entrevistas e discursos públicos feitos nos últimos três anos, a Renascença resume ideias fortes de Sampaio da Nóvoa.

Situação política
"Em tempos tão duros como os de hoje, ninguém tem o direito de ficar em silêncio".

"Portugal precisa de abrir um tempo novo na sua história, na sua vida política. Este tempo da troika está esgotado (….) Não consigo separar este Governo da troika nem a troika deste Governo. O Governo já não devia existir. Parece-me óbvio que já devia ter sido demitido."

"Em Portugal, na Europa e no mundo. O nível de selvajaria chegou a tal ponto que temos que reconquistar algum controlo sobre as nossas vidas."

"A segunda reconfiguração destas energias de mudança são as pessoas que acreditam nas sociedades. Vivemos numa dicotomia Estado/mercados como se esta fosse a única possível. E há uma dimensão, que é sempre a mais importante quando estamos num impasse, quando estamos à deriva. A minha âncora é sempre a mesma: a liberdade. No meio disto tudo, onde é que está a liberdade? A liberdade, hoje, está no reforço da sociedade".

"Não podemos perder a pátria nem por silêncio nem por renúncia".

"O trabalho precário é um cancro para o desenvolvimento económico e o desemprego jovem é a morte a prazo da sociedade".

Educação
"É tempo de dizer não. Não à degradação da escola pública. Não à mobilidade dos professores. Não a um país sem futuro. Como dizia Sophia de Mello Breyner: 'Perdoai-lhes, Senhor, porque eles sabem o que fazem'".

"Quando Crato fala do Português e da Matemática, hoje, a metáfora é a mesma que levou à escola salazarista. Uma escola paupérrima, medíocre, minimalista."

"Nunca tivemos uma política educativa tão extremista e tão fundamentalista, pelo menos desde os anos 50."

"Estamos a recuar, em termos de percentagem do PIB dedicado à Educação, a valores da década de 80, quando a escolaridade obrigatória ainda era de quatro anos, quando havia muito menos pessoas no sistema. O retrocesso não se nota de imediato, não é amanhã. Estamos a criar um atraso e um desastre – é a palavra certa – que vai ter consequências graves no futuro".

Desigualdades
"A regra de ouro de qualquer contrato social é a defesa dos mais desprotegidos. Penso nos outros, logo existo (José Gomes Ferreira). É o compromisso com os outros, com o bem de todos, que nos torna humanos."

"Começa a haver demasiados ‘portugais’ dentro de Portugal. Começa a haver demasiadas desigualdades. E uma sociedade fragmentada é facilmente vencida pelo medo e pela radicalização. Façamos um armistício connosco, e com o país. Mas não façamos, uma vez mais, o erro de pensar que a tempestade é passageira e que logo virá a bonança. Não virá. Tudo está a mudar à nossa volta. E nós também".

"Há dois elementos importantes: um são as pessoas que já não aceitam um mundo regulado por um capitalismo financeiro completamente selvagem, sem nenhum controlo, especulativo. Que está a destruir as sociedades. A criar cada vez mais pobreza, mais desigualdade. Desta crise resultam mais ricos e resultam mais pobres. Não podemos deixar de voltar aos vampiros de que falou o Zeca Afonso. São outros vampiros, mas é impressionante como se relê aquela letra..."

Europa
"A Europa não é uma opção, é a nossa condição. Uma Europa com uma nova divisa: liberdade, diversidade, solidariedade".

"A Europa é o nosso futuro, mas não nos iludamos. Ou nos salvamos a nós, ou ninguém nos salva (Manuel Laranjeira). Falemos, pois, de Portugal e dos portugueses".

"Esta Europa e esta União Económica e Monetária não nos servem".

Austeridade
"A austeridade está a ser um desastre. Todos o reconhecem, mesmo os seus autores, menos aqueles que vivem no país da propaganda do governo"(…) "[é necessário] acabar com esta política antes que esta política acabe connosco".

"Se não formos nós a acabar com esta política ninguém o fará por nós".

"É uma ideologia que assenta em visões tecnocráticas que não colam com a realidade, que destroem a economia e as pessoas".

Os políticos
"Com políticos antigos não haverá políticas novas".

"[Com políticos de carreira] ficará tudo enredado em calculismos, golpes, hesitações, sem elevação e sem futuro. Recusemos sebastianismos, populismos, justicialismos".

"Quem gostar muito de dinheiro deve afastar-se da política. Se tiver as mãos atadas por promiscuidades, tramas e tramóias, não terá condições para defender o interesse de todos".

Sampaio Nóvoa sobre Sampaio Nóvoa
"A minha disponibilidade é para dar tudo seja em que lugar for. Não é disponibilidade no sentido de ser candidato à Presidência".

"O que me interessa rigorosamente é que haja mudança e um novo ciclo político em Portugal. Qualquer gesto da minha parte tem de ser um gesto que possa acrescentar, unir, ajudar a esse processo de mudança e não prejudicá-lo".

"Quem fala publicamente e assume certas posições não pode depois esconder-se, demitir-se, ficar em silêncio. Eu contribuirei na medida das minhas possibilidades para o que puder nesse projecto de mudança seja em que lugar for. Não quero nada. Estou disposto a tudo, mas não quero nada".

"Penso em Eanes quando penso na minha candidatura".

"O momento de brincar ao esconde-esconde tem de acabar".

"Chegou de novo o dia em que temos de pensar mais nos outros do que em nós, em que temos de nos virar para o país, procurar sentidos, construir sentidos, uma vida digna de ser vivida".


A maior parte destas citações são retiradas de duas entrevistas ao "Jornal de Negócios", outra ao "Público" e ao "Jornal de Notícias". Há também citações retiradas do discurso do 10 de Junho de 2012, da intervenção em Maio de 2013 na Aula Magna, em Lisboa, na conferência "Libertar Portugal da austeridade", e no 11º Congresso Nacional dos Professores.