03 nov, 2017
A relação entre o Estado e a economia é frequentemente caracterizada no mesmo espaço em que se colocam as opiniões políticas: esquerda e direita. Por outras palavras, a esquerda propõe que o Estado tenha uma posição activa, o que tipicamente significa: tributação progressiva; serviços gratuitos (saúde, educação, etc); regulação directa dos mercados; propriedade colectiva dos meios de produção; e por aí fora.
A direita, pelo contrário propõe que o Estado garanta apenas o mínimo necessário para o funcionamento da economia: segurança pública, direitos de propriedade, e pouco mais.
Claro está que esta é uma visão simplista: há muitos tons de cinzento entre o preto e branco dos extremos da extrema esquerda e da extrema direita. Há muito poucas pessoas que se identificam com as perspectivas radicais do parágrafo anterior. O que me parece mais grave, no entanto, não é tanto o simplismo com que a esquerda caracteriza a direita e a direita caracteriza a esquerda. O que me parece mais grave é que, num espaço de opiniões unidimensional, facilmente caímos no erro de confundir meios com fins.
A solidariedade social pode ser atingida de várias formas: aumentando os salários dos mais pobres; criando um sistema de rendimento mínimo; fornecendo transportes gratuitos ou habitação subsidiada — e muitas outras possibilidades. Neste contexto, é perfeitamente possível ser-se favorável ao fim (a melhoria do bem-estar dos menos favorecidos) e opor-se a um determinado meio (por exemplo, o salário mínimo).
Nos últimos dias, discutiram-se vários exemplos relacionados com esta dicotomia entre meios e fins: o vale mobilidade (subsídio de transporte); a habitação social (possivelmente com propriedade pública); o PREVPAP (Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública); a regulação, por parte da Autoridade para as Condições de Trabalho, das desigualdades salariais em empresas com mais de 100 trabalhadores; manuais gratuitos até ao 12º ano; abertura de novas creches; e mais.
Para bem do debate público, seria bom que distinguíssemos entre fins e meios; e compreendêssemos que a oposição a algumas destas medidas não implica que o opositor "não tenha coração" ou seja um "economicista" para quem "apenas interessam os números".
Há meios e há fins.