18 out, 2017
Anda muita gente a reclamar a demissão da Ministra da Administração Interna. Mas ocorreu já uma demissão mais importante: a do Estado, que deveria proteger a vida e os bens dos seus cidadãos e não o fez.
A tragédia de Pedrógão foi considerada um caso excepcional, único. Mas quatro meses depois voltou a acontecer uma tragédia de dimensão semelhante. Só que, entretanto, seguindo a programação feita em Janeiro e apesar de os meteorologistas alertarem para um Outubro muito quente, foram dispensados importantes meios. Ignorando que as alterações climáticas têm efeitos, incluindo na seca extrema. Com mais gente no terreno e mais meios aéreos a recente tragédia não teria sido evitada, mas as suas consequências teriam sido bem menos dramáticas.
Perante a sua própria impotência e incapacidade de prevenir, os governantes passaram a um novo discurso: apelar à sociedade civil que trate do assunto. Decerto que muitos incêndios têm origem em negligência de pessoas. Mas a primeira obrigação de um Estado digno desse nome é proteger as populações.
O primeiro-ministro, como é seu hábito, chutou para canto e agarrou-se ao relatório da Comissão de peritos – o qual critica severamente, entre outras coisas, o ataque ao incêndio de Pedrógão. Ora as linhas básicas desse ataque, e dos outros, seguiu as orientações traçadas por António Costa quando ministro da Administração Interna no primeiro governo de Sócrates.
Costa avisou que haverá mais incêndios. Como quem diz “habituem-se!”. A ministra pediu aos portugueses maior “resiliência” perante as catástrofes. E o secretário de Estado das Florestas aprofundou a nova política neoliberal do governo: “Têm de ser as próprias comunidades a ser proactivas e não ficarmos todos à espera de que apareçam os nossos bombeiros e aviões para nos resolver os problemas. Temos de nos autoproteger, isso é fundamental”. Como se milhares de populares não tivessem dado um contributo enorme no ataque aos fogos dos últimos dias.
Ou seja, é para a Governo aceitável que aconteçam coisas como a relatada ontem à Renascença por um empresário. A Sanindusa, empresa de cerâmica sanitária situada na Tocha, que utiliza tecnologia de ponta e exporta 70% da produção, ardeu totalmente. O seu administrador queixa-se de não ter recebido ajuda de ninguém para combater as chamas, apesar dos pedidos de socorro. E de a empresa ter fornos a trabalhar a altíssimas temperaturas e toneladas de gás armazenadas.
Por este andar, lá chegará o dia em que A. Costa pedirá que milícias populares combatam o crime. E entregue prisões a privados. Para já, mostrou a sua dificuldade em governar quando o vento está contra.