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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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O culto da memória

20 fev, 2017 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


As memórias, de fraca tradição entre nós, tornam-se mais importantes quando as cartas são substituídas por suportes electrónicos.

O livro autobiográfico do ex-Presidente Cavaco Silva tem sido largamente referido e comentado na comunicação social. Como ainda não o li, não o comento agora. Mas julgo saudável que o político português que exerceu durante mais tempo os cargos de primeiro-ministro e de Presidente da República continue a escrever livros autobiográficos.

É uma tradição na Grã-Bretanha que, em Portugal, é pouco seguida. Já no século XIX, os governantes portugueses não tinham grande inclinação para escreverem memórias - embora existam memórias notáveis, como as do Marquês de Fronteira e as do Duque de Loulé.

Claro que as memórias não são documentos imparciais, pois transmitem visões pessoais de protagonistas da história. Por isso, são necessariamente alvo de controvérsia, que, às vezes, se prolonga por séculos. No seu habitual tom furibundo, José Sócrates já reagiu ao livro de Cavaco Silva.

Mas mesmo memórias que nem sempre se revelam verídicas têm interesse - é o caso, por exemplo, das “Mémoires d’Outre-Tombe”, de Chateaubriand, escritas há quase dois séculos. Compete aos historiadores avaliar a veracidade das autobiografias, comparando-as com outros documentos.

Até há pouco, havia uma fonte histórica importante que está a desaparecer: as cartas, agora cada vez mais substituídas por telefonemas, sms, e-mails, intervenções nas redes sociais, etc., material que não perdura.

Daí, a responsabilidade acrescida de quem desempenhou cargos de grande responsabilidade: deve escrever memórias.

Comentários
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  • Justus
    20 fev, 2017 Espinho 21:58
    Quando Sarsfield Cabral se preocupa em fazer referência e propaganda a umas "bisbilhotices" de Cavaco Silva, está tudo dito!! Será que esta gente não tem vergonha na cara? Claro que Cavaco tinha que escrever umas frases, como acontece neste país com todo o "gato pingado". Aqueles que sempre foram considerados pouco cultos, de inteligência mediana e sem nada que os distinga neste mundo têm que se vangloriar a si próprios. Quem não sabia quantos cantos têm os Lusíadas, falava com a boca cheia e não era capaz de proferir duas frases seguidas, a não ser que tivesse a "lenga lenga" escrita por um qualquer secretário, quer agora mostrar que também é gente. Pobre Cavaco!
  • MASQUEGRACINHA
    20 fev, 2017 TERRADOMEIO 18:47
    As memórias de Cavaco Silva até são dignas de iniciar um novo sub-género, ou pelo menos título de colecção: as "Memórias Selectivas". E o Cavaco-que-morde-pela-calada e o Sócrates-furibundo estão muito bem um para o outro, por diferentes que pareçam. Quanto ao Coelho, espero pelas Memórias de Marcelo (que ele disse que não escreveria, mas eu suspeito que já estão em fase adiantada). De certeza com bastante mais estilo e suspense, o Coelho será servido frito e frio, acompanhado de vichyssoise. Venham as memórias: sempre se vão sabendo umas coisas, e assistindo a umas fitas entre as comadres.
  • DR XICO
    20 fev, 2017 LISBOA 10:08
    De muito se falar em porcarias, algum dia ainda alguém as compra. O mesmo de aplica a este deposito de ódio e vingança de Cavaco ao PS. Portugal tem tido gente muito fraca e mediocre no poder, estava a pensar em Cavaco, PAssos coelho , Maria Luís Albuquerque, Santana Lopes, entre outros mas estes
  • Miguel Botelho
    20 fev, 2017 Lisboa 08:51
    De facto, concordo com o ponto de vista de Sarfield Cabral. As memórias perfazem uma leitura interessante. É o caso das memórias do Marquês da Fronteira, em cinco volumes e publicado pela imprensa nacional - casa da moeda; as memórias de Raúl Brandão; ou mesmo «Um escritor confessa-se» de Aquilino Ribeiro. Sobre as memórias de Cavaco Silva, quem o quererá ler? Será esta literatura interessante? Serão estas memórias consideradas literatura? Um homem que não a diferença entre Thomas More e Thomas Mann, tem estofo para escrever memórias? Soubemos, de antemão, que Cavaco Silva poupou Passos Coelho do seu livro de memórias, por este agora ser membro da oposição. Ou seja, o pior momento do seu mandato, como presidente, encontra-se cortado. Já sei que Domingos e Vítor Lopes não vão concordar com este ponto de vista. Estes últimos já estão impacientes pela publicação do segundo tomo das memórias de Cavaco.