28 dez, 2016
Foi há 25 anos que todo o Leste da Europa se despediu do seu passado, selando o fim da Guerra Fria e culminando o processo de libertação contra o comunismo iniciado em 1989, com a queda do Muro de Berlim.
A 26 de Dezembro de 1991 – no fecho do ano que começara com a derrota de Saddam Hussein na 1.ª Guerra do Golfo – uma resolução do Soviete Supremo de Moscovo pôs fim à URSS, liquidando assim, de forma burocrática e prosaica, 70 anos de história, e dissolvendo o que durante o século XX fora a grande pátria irradiadora do comunismo à escala global. No dia anterior, Mikhail Gorbachev, o 7.º e último líder da União Soviética, declarara extinto o seu cargo e entregara todos os poderes ao presidente da Rússia, Boris Ieltsin.
Não era assim que “Gorbi” gostava de ter entrado para a história. Quando chegou ao Kremlin, em 1985, vinha para reformar o sistema, relançando a economia soviética, cimentando a confiança na ideologia comunista e reforçando a solidez da União das 15 Repúblicas. A Perestroika e a Glasnost surpreenderam. Parecia uma nova NEP, com um Lenine muito mais urbano e simpático. Como também surpreendeu a retirada do Afeganistão, compreensível porque a URSS não conseguia já custear aquele “Vietname do Cáucaso”. Gorbachev não queria ser o coveiro da União Soviética: mas a energia reformadora e os ventos de abertura que semeou deixaram-no progressivamente isolado, entre os “liberais” que lhe pediam mais e os “ultras” que lhe reprovavam as inovações e as simpatias que suscitava (e que ele cultivou) no Ocidente (Reagan, Bush, Thatcher ou Kohl).
Quando os ventos de liberdade chegaram ao Leste da Europa, Gorbi deixou claro que, com ele, não se repetiriam 1956 ou 1968. Chernobyl já demonstrara a obsolescência do aparelho industrial soviético. No final da década, as reformas paralisaram, a corrupção era gigantesca, a ideologia já não mobilizava ninguém e, pior, os separatismos independentistas saíram à rua. Depois da tentativa de golpe de Estado dos “ultras”, em Agosto de 1991, e no espaço de poucas semanas, todas as repúblicas se separaram da União. A chamada CEI, Comunidade de Estados Independentes, foi formalizada a 21 de Dezembro, com 11 ex-Repúblicas da URSS (ficaram de fora os Estados bálticos e a Geórgia). Gorbachev esperou pelo Natal para fechar a porta e entregar a chave.
Passaram 25 anos. Herói acidental para uns, vilão traidor para outros, Gorbi tem hoje 85 anos. Viúvo desde 1999, entretém-se a presidir a uma Fundação discreta. Os media russos censuram-no e os políticos do Kremlin voltam-lhe as costas. Há vozes na corte de Vladimir Putin que gostavam de o processar e julgar por ser “agente estrangeiro” e ainda mais pelo “crime” de ter provocado o colapso da URSS. Gorbachev, por seu turno, reconhece ser um dos homens mais detestados da Rússia, e sente-se também traído pelos EUA, a quem critica a expansão da NATO para o Leste.
À actual Rússia, acha ele, faltam liberdades e democracia, e o bem-estar económico está sequestrado por uma oligarquia estatista. No seu juízo, Putin está a sofrer do mesmo mal de que ele reconhece ter padecido: “excesso de autoconfiança”. Por isso critica a nova agenda internacional aventureira de Moscovo, que é diplomaticamente arriscada e, sobretudo, caríssima. Como ele bem experimentou, um império sem dinheiro colapsa como um castelo de areia. E se isso acontecer à Rússia actual, as consequências domésticas e internacionais serão imprevisíveis e poderão ser cataclísmicas. Um quarto de século volvido, estará Putin a caminho de vir a terminar como Gorbachev?