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Manuel Pinto
Opinião de Manuel Pinto
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​Entre o pior e o melhor dos tempos

08 jul, 2016 • Opinião de Manuel Pinto


As palavras abrem o livro “Um conto de duas cidades”, de Charles Dickens, que se passa em Londres e Paris, antes e durante a Revolução Francesa. Elas poderiam aplicar-se aos nossos dias, tantos e tão desvairados são os acontecimentos.

“Era o melhor dos tempos, era o pior dos tempos; era o tempo da sabedoria e o tempo da loucura; o tempo da crença e o tempo da incredulidade; a estação da luz e a estação das trevas; o cume da esperança e o inverno do desespero: tudo isto encontrávamos diante de nós”.

As palavras, de tons apocalíticos, abrem o livro “Um conto de duas cidades”, de Charles Dickens, que se passa em Londres e Paris, antes e durante a Revolução Francesa. Elas poderiam aplicar-se aos nossos dias, tantos e tão desvairados são os acontecimentos. Perante eles, um amigo comentava, esta semana: “foram-se os anos em que nos dávamos ao luxo de ter uma ‘silly season’”.

As notícias trazem-nos o pior e o melhor daquilo que a vida humana tem e de que somos capazes. Mas talvez ao contrário de outras épocas, nós corremos o risco de já não nos surpreendermos com nada, posta cá fora a exclamação de espanto que cada coisa nova por si desencadeia. Os acontecimentos são como aquelas flores de cato que desabrocham e murcham no mesmo dia. A notícia do jantar faz esquecer a da manhã. O cansaço, a incompreensão ou o medo ou uma mistura de tudo isto fazem o cimento da carapaça onde resvalam os sinais e os desafios que as notícias carregam.

E, no entanto, nada disto significa que tenha desaparecido a inquietação, a busca de sentido e mesmo o testemunho, no meio das desvairadas coisas que o cenário do mundo apresenta. Nem que tenha desfalecido o empenho de tantos jornalistas por, no meio da tribulação, fazerem do seu trabalho uma busca constante daquilo que o cidadão comum precisa de saber para se posicionar de forma mais esclarecida naquele cenário.

Faz cada vez mais falta reinventar os modos de juntar forças e de agir, adaptados aos tempos incertos que vivemos. Algumas vezes isso passará por encontrar as pontas de um novelo algures abandonadas. Noutras vezes será preciso pôr a imaginação a funcionar e inventar novos caminhos. Mas é imperioso aprender a ver, no emaranhado dos dias, aquilo que são os sinais de sabedoria e de luz, que permitem a tantos continuarem lucidamente a dizer que estes são os melhores dos tempos.

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