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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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O risco de abrandamento económico

11 abr, 2018 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


O défice das contas externas afligiu cronicamente a economia portuguesa. Em 2017 foi eliminado. Até quando?

Em Portugal fala-se muito do défice das contas do Estado. Até se compreende: em democracia, apenas num ano essas contas foram equilibradas. Aconteceu em 1913, sendo ministro das Finanças Afonso Costa.

A I Guerra Mundial, mesmo antes de Portugal nela participar, acabou com a exceção. Em ditadura, Salazar contruiu o seu prestígio político no final da década de 20 do séc. XX eliminando aquele défice, com alguma dose de contabilidade criativa (que a censura não permitia denunciar).

Hoje discute-se se o défice orçamental não deveria ser um pouco maior, para permitir mais investimento público e mais despesas correntes em sectores como a saúde.

O défice que fica na sombra é o externo, aquele que porventura mais conta para o nosso futuro. Até no artigo que Mário Centeno escreveu no “Público”, defendendo a sua política, apenas se encontra uma brevíssima referência à redução do endividamento externo.

Ora em 2017 Portugal conseguiu ter contas externas equilibradas, algo que não acontecia há muito tempo. No final do século passado o défice externo ultrapassava os 10% do PIB. A balança comercial, englobando importações e exportações de bens e serviços, só deixou de ser deficitária em 2012, com a austeridade imposta pela “troika”.

No ano passado uma aceleração das exportações de 7,9%, comparando com 4,4 % em 2016, e com as importações a subirem a igual ritmo (contra 4,2% em 2016) foi possível manter o excedente externo. Nem a subida apreciável do investimento em 2017 (embora ainda muito baixo em termos absolutos, ao mesmo nível de 1995) desequilibrou as contas externas, através de uma forte subida das importações, conforme acontecia quase sempre nas últimas décadas.

Será que em 2018 o excedente externo se irá repetir? O Banco de Portugal, no final de Março, previa um claro abrandamento da procura externa, iniciando-se este ano e acentuando-se em 2019 e 2020.

O espetacular “boom” do turismo estrangeiro, que deu e dá um contributo decisivo para equilibrar as nossas contas externas, não deverá manter-se com a mesma intensidade de crescimento nos próximos anos. E as importações de bens têm subido recentemente acima das exportações (que, no entanto, continuam a subir a bom ritmo). No trimestre Dezembro de 2107, janeiro e fevereiro de 2018, as exportações aumentaram 5,6% em relação ao período homólogo um ano anterior, mas as importações cresceram mais: 6,8%. Ou seja, o défice comercial agrava-se.

Não é dramático – mas poderá vir a sê-lo se a economia internacional sofrer um choque negativo com as perspetivas de guerra comercial que estão bem à vista. E Portugal tem uma das maiores dívidas públicas do mundo, em percentagem do PIB. Por isso se compreendem as cautelas do ministro das Finanças, que não quer “colocar em risco” os progressos alcançados. Também se compreende a insistência de A. Costa em que a austeridade tinha acabado de vez, o que é obviamente falso.

Ganhou com isso popularidade, expressa nas sondagens. Mas aumentou o risco que o seu ministro das Finanças quer eliminar.

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  • António Costa
    11 abr, 2018 Cacém 15:59
    "Em 2017 foi eliminado. Até quando?" ....Bem, até e enquanto durar a "geringonça".....