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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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​Alergia aos comboios

15 fev, 2018 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


Sucessivos governantes prometeram e prometem modernizar o caminho de ferro. Depois, quase nada acontece.

No primeiro governo de Guterres, após dez anos de Cavaco Silva ser primeiro-ministro, uma das medidas mais badaladas foi a aposta no caminho de ferro. A ideia era que Cavaco tinha investido demais no betão (autoestradas) e desprezado o transporte de pessoas e mercadorias por via ferroviária. Depois, tudo correu ao contrário. Portugal tornou-se no país europeu com maior densidade de autoestradas e com menor utilização do caminho de ferro – este, de 3.608 quilómetros há trinta anos passou para 2546 quilómetros hoje. É o único país da Europa onde número de quilómetros de autoestrada ultrapassa o de linhas férreas.

O Público da passada terça-feira divulgou uma elucidativa reportagem de Carlos Cipriano sobre o caminho de ferro em Portugal. “Já nos anos 60 os planos de investimento ferroviários não eram cumpridos. Na história da democracia raro foi o governo que não resistiu a apresentar o seu plano para os caminhos de ferro, sem que, no entanto, o tenha executado”. Estranha alergia esta aos comboios, que também se manifestou no fecho de inúmeras linhas no interior, por falta de passageiros. E a alegada modernização da linha do Norte (Lisboa-Porto) prolongou-se ao longo de vinte anos, custou uma fortuna, mas não permite, em certos troços, altas velocidades. Um escândalo de desperdício, muito pouco investigado. Entretanto, linhas que em tempos foram modernas e lucrativas estão hoje em perigosa decadência, como a linha Lisboa-Cascais.

O presente governo segue a tradição. Segundo o Público, o plano deste governo para a ferrovia só avançou 79 quilómetros em dois anos, num total de 528 que deviam estar em obras. Só 15% das obras previstas têm obras no terreno. Apenas a linha do Minho está verdadeiramente a ser modernizada, entre Nine e Viana do Castelo (43 quilómetros). Atrasos em estudos, empreiteiros incapazes, demora do visto do Tribunal de Contas e muitos outros motivos são invocados pelo governo para esta bizarra situação. Aceitem, ao menos, um conselho: não façam mais promessas. É que o sistemático incumprimento do prometido leva, naturalmente, as pessoas a não terem qualquer confiança no que dizem os governantes.

Comentários
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  • Carlos
    15 fev, 2018 Lisboa 22:29
    Infelizmente, as suas ideias, Sr. Sarsfield Cabral, já estão velhas e têm muitas teias de aranha. Surpreendo-me pela Renascença ainda contratá-lo para dar opiniões cheias de ferrugem.
  • ADISAN
    15 fev, 2018 Mealhada 14:50
    Lamento muito o que está a acontecer aos caminhos de ferro portugueses. Filho de ferroviário, nascido com a 2ª Guerra mundial em 1939, sempre fui um grande admirador dos caminhos de ferro, hoje a nível mundial. Há alguns anos havia um programa de TV alemão (língua que falo) transmitido por satélite e eu não perdia pitada do mesmo, pois apresentava as maravilhas dos comboios de todo o mundo. Em muitos casos, como na Suíça, por ex., muito voltados para o turismo. Ali vi e reconheci as minhas velhas conhecidas máquinas a vapor de via estreita, que ali circulam ainda com as matrículas CP - E 195 e outros números idênticos, o que significa que os suíços compraram e reactivaram este material circulante para desenvolverem o seu turismo nostálgico. Se os portugueses se voltassem também para este ramo de turismo e reactivassem as linhas entretanto encerradas, (como as que serviam Viseu, Pampilhosa-Figueira da Foz, Coimbra-Lousã e algumas outras) talvez estas se tornassem rentáveis e úteis para o desenvolvimento das respectivas regiões.