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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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Defender quem compra

17 jan, 2018 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


O risco de a Caixa Económica do Montepio estar a vender, com pouca transparência, produtos da mútua mostra que pouco se aprendeu com o colapso do BES/GES.

Um dos mais graves problemas do colapso do BES e do grupo Espírito Santo foi, como se sabe, a venda aos balcões daquele banco de títulos de dívida de empresas do grupo, que eram apresentados como uma espécie de depósitos bancários.

Só que não eram depósitos e, portanto, não gozavam das garantias deles, como serem abrangidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos. Muita gente comprou papel comercial do GES convencida de que se tratava de uma aplicação segura, mas foi enganada.

Provavelmente, a maioria dos funcionários do BES que venderam esses produtos não estava consciente de que oferecia gato por lebre.

O Banco de Portugal apertou depois as exigências de transparência na venda de aplicações financeiras aos clientes dos bancos, em particular na venda pela Caixa Económica Montepio Geral de produtos da Associação Mutualista (que detém a totalidade do capital do banco, a Caixa Económica Montepio).

Ora, segundo o “Expresso”, a venda desses produtos está a ser feita nos balcões da Caixa Económica sem distinguir claramente as duas entidades. E o “Público” informou ontem que enviou jornalistas não identificados a esses balcões, que confirmaram estar ali a ser prestada insuficiente informação sobre as duas entidades – na prática, não esclarecendo cabalmente os eventuais compradores que uma coisa são depósitos bancários, garantidos até 100 mil euros por cliente, outra, bem diferente, são títulos da Associação Mutualista, mais arriscados.

O Banco de Portugal apenas supervisiona a Caixa Económica, não a Associação Mutualista. Quem fiscaliza esta associação e os títulos que ela emite é o Ministério do Trabalho, Segurança e Solidariedade Social. Pelos vistos, essa fiscalização não está a funcionar com eficácia. Depois do que se passou com o BES/GES, tal negligência suscita perplexidade.

Entretanto, o “Observador” publicou no passado dia 11 um notável artigo de Helena Garrido, onde se denuncia que “o problema está na enorme e perigosa dependência entre a Associação Mutualista e a Caixa Económica Montepio Geral”.

E observa H. Garrido que “a mútua usa os balcões do banco para vender produtos seus – leia-se, arrecadar poupanças. Alguns desses produtos, não sendo seguros, são vistos pelos clientes como tal. E não são seguros porque não respeitam as regras que as seguradoras têm de cumprir”.

Helena Garrido afasta simplismos quanto à probabilidade de a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa entrar no capital da Caixa Económica – como dizer que os pobres estariam a financiar os ricos.

O problema é mais complexo: H. Garrido não exclui essa entrada, mas mostra que ela apenas será útil se for concretizada a preço razoável; não é o caso dos 200 milhões de euros de que se fala. Mais importante: “é irracional e perigoso que a Santa Casa entre na Caixa Económica sem exigir mudanças na forma como ela e o seu accionista são geridos”.

Comentários
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  • Justus
    17 jan, 2018 Espinho 18:32
    Os capitalistas deram cabo do capitalismo e continuam a faze-lo! Em Portugal deram cabo de alguns Bancos, levando-os à falência, por desleixo e incompetência. Que o capitalismo ruísse, por pressão e combate feito por outros sistemas económicos, ainda se admite. Agora, cair de podre e ainda por cima espezinhado pelos seus ardentes defensores e seguidores, como Sarsfield Cabral, é coisa nunca vista. Se não sabem gerir o sistema bancário, calem-se e deixem que os outros o façam. Não fica bem ter inveja de quem está tentando reverter o estado degradante a que chegou a Banca no tempo do governo anterior! Há meses atrás era a CGD, agora é o Montepio! Até onde vai a inveja e ódio capitalista!