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Pandemia de Covid-19

Investigador sueco ocultou excesso de mortalidade em crianças para defender medidas do país

03 mar, 2021 - 17:17 • Joana Gonçalves

Uma troca de emails entre o investigador e o responsável pelo planeamento das medidas de combate à pandemia na Suécia revela que o pediatra ocultou dados que davam conta de um excesso de mortalidade em crianças em idade escolar.

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O epidemiologista e pediatra sueco Jonas Ludvigsson, do Instituto Karolinska, está a ser acusado de ocultar dados sobre o risco de transmissão da Covid-19 associado a crianças em idade escolar na Suécia.

Não é a primeira vez que o investigador, um defensor das políticas pouco ortodoxas do país no combate ao novo coronavírus, é alvo de críticas por parte da comunidade científica.

Uma queixa enviada ao The New England Journal of Medicine (NEJM) sugere que Jonas Ludvigsson e os restantes autores de um dos artigos publicados na revista científica “ocultaram deliberadamente dados importantes que contradizem as conclusões a que chegaram”.

A denúncia foi feita por Bodil Malmberg, uma cidadã de Vårgårda, na Suécia, adianta a revista Science. Malmberg recorreu à lei de registos abertos para obter uma troca de e-mails entre Ludvigsson e o epidemiologista sueco Anders Tegnell, responsável pelo planeamento das medidas de combate à pandemia no país.

Em declarações à revista Science, Jonas Ludvigsson não nega o conteúdo dos e-mails, mas mantém a defesa das conclusões do estudo.

O epidemiologista sueco foi um dos 47 signatários da Declaração de Great Barrington, um documento publicado em outubro de 2020 que defendia a imunidade de grupo por meio da infeção natural da população. A investigação de Ludvigsson apoiava precisamente a mesma ideia.

Numa publicação sobre o papel das crianças na transmissão do vírus, divulgada na Acta Paediatrica em maio de 2020, o investigador escreveu que não houve "nenhum surto importante em escolas na Suécia". Porém, como observaram os críticos, os meios de comunicação social do país tinham já relatado vários surtos em escolas, incluindo um em que pelo menos 18 dos 76 funcionários foram infectados e um professor morreu.

Além disso, Ludvigsson observou que 69 crianças com idades entre 1 e 16 anos morreram na Suécia, entre março e junho de 2020, em comparação com 65 entre novembro de 2019 e fevereiro de 2020, sugerindo que a pandemia não levou a um aumento da mortalidade infantil.

Mas os e-mails obtidos por Malmberg mostram que, em julho de 2020, Ludvigsson escreveu a Tegnell que “infelizmente vemos uma indicação clara de excesso de mortalidade em crianças com idades entre 7 os 16 anos, as idades em que as crianças frequentam a escola”.

“Entre os anos de 2015 até 2019, uma média de 30,4 crianças nessa faixa etária morreram nos quatro meses da primavera. Em 2020, morreram 51 crianças nessa faixa etária = mortalidade excessiva + 68%”, escreveu Ludvigsson.

Segundo a Science, o epidemiologista sueco Jonas Björk, da Lund University, adiantou que a comparação de tempo usada no jornal é incomum. “Não vejo nenhuma boa razão para comparar com os meses anteriores”, diz ele. “É padrão comparar com o mesmo período em anos anteriores para diminuir a incerteza estatística”, defendeu.

Ludvigsson optou por não sinalizar o aumento de 68% das mortes em crianças em idade escolar e disse, em declarações à Science, que foi um revisor do NEJM quem sugeriu a comparação entre novembro e fevereiro de 2019, em vez do período homólogo do ano anterior.

Apesar de continuar a defender o método aplicado na sua investigação, o pediatra sueco adiantou que, devido às duras críticas e ataques pessoais de que foi alvo, vai abandonar a investigação sobre a Covid-19.

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